A atleta que levou a Nike a investigar seu programa de elite

O enredo parecia próximo do fim para o programa de treinamento de atletas de elite, o Nike Oregon Project. O técnico à frente do time, Alberto Salazar, foi suspenso pela Usada (Agência Antidoping dos Estados Unidos, na sigla em inglês) e teve a licença revogada pela Iaaf (Associação Internacional de Federações de Atletismo).

Na sequência, a marca encerrou o projeto, e o presidente-executivo anunciou que deixaria o cargo em janeiro. E tudo isso começou em 2015, quando surgiram as primeiras denúncias de que Salazar teria administrado substâncias banidas em seus atletas.

Mas novas notícias ligadas ao finado programa surgiram esta semana, e a Nike anunciou que irá realizar uma investigação sobre as acusações de atletas de pressões abusivas dentro do Oregon Project, segundo o jornal britânico The Guardian.

O estopim foram as alegações da ex-atleta prodígio americana, Mary Cain, de que a pressão constante de Salazar para que perdesse peso acabaram com sua carreira. O técnico insistia que ela, com 1,70 m, deveria pesar 51 kg.

Hoje com 23 anos, Cain entrou para o programa com 16. A atleta disse ainda que não recebeu nenhum tipo de apoio quando ficou sem menstruar durante três anos, quebrou cinco ossos por causa de osteoporose e teve pensamentos suicidas.

“Ao invés disso, eu era emocional e fisicamente abusada por um sistema desenhado por Alberto e apoiado pela Nike.”

As denúncias foram feitas em vídeo publicado no jornal americano The New York Times, nesta quinta-feira (7). Não demorou muito, e outros atletas, publicamente, compartilharam suas histórias e apoiaram Cain.

A americana Amy Yoder Begley, que participou da Olimpíada de 2008, em Pequim, disse ter sido expulsa do Nike Oregon Project por ser gorda demais.

Já Kara Goucher, também dos Estados Unidos, retuitou uma publicação de seu marido que contava como Salazar e Darren Treasure falaram para familiares que a atleta precisava perder o peso da gravidez. Ela completou a Maratona de Boston em 2011 em quinto lugar apenas seis meses após dar à luz.

O canadense Cam Levins também usou a rede social para pedir desculpas publicamente.

“Eu sabia que nossa equipe técnica era obcecada com sua [de Mary Cain] perda de peso, enfatizando de tal maneira como se fosse a única coisa que a impedia de ter grandes performances. Eu sabia porque eles falavam abertamente em frente a outros atletas.”

Apesar de negar as denúncias, Salazar não respondeu às tentativas de contato do Guardian.

Segundo o jornal, a Nike enviou um comunicado por email afirmando que irá investigar esses casos, mas que desconhecia as acusações de Cain até elas se tornarem públicas nesta quinta.

“Na Nike, procuramos sempre colocar os atletas no centro de tudo que fazemos e essas alegações são completamente inconsistentes com nossos valores”, diz o texto.

“São alegações profundamente perturbadoras que não haviam sido feitas por Mary ou seus pais anteriormente. Mary buscava se reinserir no Oregon Project e no time de Alberto em abril deste ano.”

Na manhã desta sexta (8), Cain confirmou que chegou a querer voltar para o programa em uma publicação no Twitter. “Eu queria um desfecho, um pedido de desculpas por nunca ter me ajudado quando eu estava cortando e sozinha, triste e nunca totalmente curada, queria que Alberto me aceitasse de volta. Eu ainda o amava. Porque quando deixamos as pessoas nos magoarem, desejamos mais do nunca sua aprovação.”

Ela escreveu ainda que eles se desconectaram mais rapidamente, o que foi o fim para ela. “Ele não se importava comigo como pessoa; somente como o produto, a performance, a atleta.”