Com adiamento da São Silvestre, corredores fazem sua própria prova

Dezenas de milhares de corredores não partirão em direção à avenida Doutor Arnaldo, passarão pelo coração de São Paulo no cruzamento das avenidas Ipiranga e São João, nem subirão a avenida Brigadeiro Luís Antônio para cruzar a linha de chegada da mais tradicional corrida de rua do Brasil na avenida Paulista, neste 31 de dezembro.

O adiamento da 96ª edição da São Silvestre para julho do próximo ano devido à pandemia de coronavírus não impediu, porém, que corredores de São Paulo percorram seus 15 km. Atleta amador, Demétrius Carvalho, 47, teve a prova como sua meta desde que começou a praticar o esporte, em 2014, e participava todo ano.

“Por isso esse ano vou correr assim mesmo, só que à noite, então literalmente vou virar o ano correndo”, afirma. Para ele, realizar o percurso antigo, em especial após um ano de provas canceladas ou adiadas, como a própria tradicional competição paulistana, “tem um resgate da São Silvestre que eu via na televisão quando criança”.

Segundo ele, conhecidos seus gostaram da ideia e resolveram participar da empreitada, que ocupará uma avenida Paulista com alguns praticantes, em vez do tradicional show da virada da capital. Com a procura, Demétrius acabou organizando uma prova virtual, chamada Corrida da Virada 2021, em que ele e um pequeno grupo farão o percurso da São Silvestre.

Para a festa atlética, o corredor mandou fazer camisetas e medalhas para os participantes. “Foi meio que uma brincadeira minha. Eu disse que eu corria a São Silvestre todo o ano e eu precisava da minha medalha.” A brincadeira tomou corpo, e há praticantes de fora do estado, que se animaram, pois não poderão vir participar da prova oficial.

Corredor exibe camiseta e medalha da Corrida da Virada 2021, prova virtual organizada por Demétrius Carvalho (Divulgação)

“Coloquei 2021 [no nome da competição] para entrar no ano com alguma positividade, ainda que deva continuar sendo um período difícil.” Por não ser uma corrida de rua oficial, a hidratação e a suplementação, como gel carboidrato e isotônicos, ficam por conta de cada participante.

Demétrius complementa ainda que está em contato com o governo estadual para verificar se há algum tipo de risco aos corredores.

Houve também outros grupos que mantiveram a tradição, mas de uma outra forma. Dono da assessoria CorreBrasil, Augusto de Paula, 37, organiza todos os anos um simulado da São Silvestre, em que percorre os 15 km com seus alunos, divididos em grupos de acordo com o ritmo médio de cada um.

“O pessoal gosta, acha muito divertido”, afirma o instrutor de corrida. “Tem o desafio de subir a [avenida] Brigadeiro [Luís Antônio], tentar melhorar o tempo.”

Participantes do simulado da São Silvestre, realizado pela CorreBrasil, alongam em frente ao Masp, na avenida Paulista (Divulgação)
Participantes do simulado da São Silvestre, realizado pela CorreBrasil, alongam em frente ao Masp, na avenida Paulista (Divulgação)

É esse desafio que faz Mariana Shinzato, 47, participar da pré-prova todos os anos. “É um trajeto desafiador, porque o esforço maior está no final, quando você já está cansado, vem a parte difícil”, diz a corredora. “A gente gosta de sofrer, né, gosto de participar e ver se melhorei.”

Praticante de corrida há oito anos, ela participou uma vez da São Silvestre, em 2017. “Eu queria viver essa experiência de correr a corrida mais famosa do Brasil. É uma prova diferente, correr a gente só corre depois de uns quilômetros, mas é um misto de emoção.”

Depois da estreia, ela passou a acompanhar a prova sempre da torcida, já que, por ter muitos corredores, a São Silvestre não é ideal para quem gosta de testar performance, caso de Mariana. E por isso, gosta de participar dos simulados da CorreBrasil.

Este ano, porém, o grupo e os subgrupos precisaram ser menores. “Tinha distanciamento, o maior grupo era um trio, e, quando chegaram no café da manhã, tinha álcool em gel para se higienizarem”, explica Augusto.

O banquete pós-corrida é um momento de confraternização, em que troféus são entregues. Além disso, os corredores deveriam usar máscara tanto durante a corrida como no café da manhã. Mesmo com todos os protocolos, o momento serviu para encerrar um ano praticamente sem provas de corridas de rua.

“[De benefício], além do que já se conhece da saúde, a gente precisa da saúde mental”, afirma Mariana. “Como é difícil ficar de home office, é muito bom sair um pouquinho de forma segura, encontrar algumas pessoas, conversar, sair um pouco dessa paranoia.”